Quem votou na Dilma não votou no Temer






ANDOCIDES BORGES de LEMOS | Do FACEbook | 18.05.2017

Entenda.
"Quem votou na Dilma não votou no Temer. O argumento de que o voto em Dilma foi o voto em Temer é típico de um pensamento pobre e personalista, que enxerga a política como uma disputa entre pessoas e não entre ideias e projetos."
Eleitores de Dilma Rousseff têm sido confrontados em muitos momentos pela frase: “foi você quem pôs o Temer lá”. Algumas vezes seguido pela foto da urna com a cara dos dois, é um dos argumentos mais usado por aqueles que querem dar alguma legitimidade ao processo que resultou no afastamento de Dilma e colocou no lugar uma pessoa sem votos, tentando de certa forma culpar os eleitores dela pela ascensão de Temer. O objetivo deste pequeno texto é mostrar a pobreza deste argumento, refletindo sobre as razões de tanta gente repeti-lo de forma impensada.

Para os cargos do Executivo, não votamos em pessoas e sim em projetos chefiados por indivíduos. No Brasil entre 1994 e 2014, tivemos dois partidos polarizando a disputa pela Presidência da República com dois projetos distintos, PT e PSDB. Embora semelhantes em muitas coisas, estes dois projetos apresentavam diferenças que levavam eleitores a escolher por um projeto ou outro. No do PT, tende a prevalecer a ideia de que o Estado deve ter maior interferência na economia, o Banco Central não deve ser autônomo e um aumento na carga tributária é justificado por um aumento nos gastos sociais. No do PSDB, prevalece a ideia de que o Estado deve ter menor interferência na economia, com um número maior de privatizações, autonomia do Banco Central e redução na carga tributária e dos gastos públicos, mesmo que isto signifique redução nos gastos sociais. Não há aqui juízo de valor, há apenas a descrição das maiores diferenças que acabam por fazer um eleitor optar por um ou por outro projeto.

Vivemos numa democracia de consenso. Na última eleição, por exemplo, o partido que mais elegeu deputados foi o PT, formando sozinho apenas 13% da Câmara. Para se obter uma maioria que permita a governabilidade, deve-se, portanto, buscar uma coligação com outros partidos dispostos a fazer parte do seu projeto de governo, procurando pontos em comum e cedendo cargos para que estes outros partidos sintam que possuem uma participação real na administração. Um destes cargos é a vice-presidência. Buscando a citada governabilidade, em 2010 o PT buscou o PMDB para a formação de uma chapa, chefiada pelo primeiro e com os princípios já citados no primeiro parágrafo. O objetivo aqui não é discutir sobre o fato do PT ter escolhido o parceiro errado, pois creio que isto já ficou claro, é apenas apresentar a forma como isto acontece e mostrar que a democracia consensual funciona desta forma. Nas seis eleições entre 1994 e 2014, das doze chapas chefiadas por PT ou PSDB, apenas em duas o cargo de vice não foi dado a outro partido: Lula – Mercadante em 1994 e Aécio – Aloysio Nunes em 2014.

Na eleição de 2014, como nas cinco anteriores, tínhamos estes dois projetos disputando o segundo turno. De um lado o projeto petista chefiado por Dilma Rousseff, e do outro o projeto tucano chefiado por Aécio Neves. Ao final da eleição, decidiu a maioria pela continuidade do projeto liderado pelo PT. Boa ou não, esta foi a vontade da maioria, e respeitá-la é a base do funcionamento do modelo democrático. Um ano depois, o vice Michel Temer se virou contra este projeto e passou a conspirar contra a líder do Executivo. Sendo bem-sucedido em seu plano, assumiu a presidência e convidou o lado derrotado em 2014 para governar e implantar seu projeto de governo, rejeitado nas últimas quatro eleições. Esta é uma das principais razões para que Temer e seu governo não possuam legitimidade no cargo. Sem discutir a forma como o processo de impeachment foi conduzido, seu projeto não representa a vontade da maioria que se expressou democraticamente em 2014. Falo isto novamente sem juízo de valor sobre qual projeto é melhor para o país.
O argumento de que o voto em Dilma foi o voto em Temer é típico de um pensamento pobre e personalista, que enxerga a política como uma disputa entre pessoas e não entre ideias e projetos. Existe no Brasil uma ausência de cultura política, mesmo entre a elite que se considera melhor educada, muitas vezes incapaz de aceitar o fato de que a maioria da população quer o país sendo dirigido de uma forma que não a agrade. A educação é pensada como uma forma de gerar mão-de-obra, e não como uma forma de gerar cidadania e senso crítico. Por isso, a discussão política no Brasil se transformou num bando de pessoas mimadas querendo simplesmente ganhar uma discussão a qualquer custo, sem nenhuma preocupação em gerar pensamento e reflexão. A vitória em 2014 não foi da pessoa Dilma, e sim do projeto de governo por ela chefiada. Projeto este que foi derrubado por seu vice, que passou a governar com o outro projeto que foi derrotado. Digo mais uma vez, não tento neste texto fazer um juízo de valor sobre a qualidade dos projetos. Mas o faço sobre a derrubada daquele que representa a vontade da maioria e a colocação em prática do outro que foi rejeitado. O projeto chefiado por Dilma é diferente do projeto chefiado por Temer. 
Quem colocou este último no governo não foram os eleitores da petista. Por isso, não, quem votou em Dilma não votou em Temer."

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